segunda-feira, 27 de maio de 2013

Preço é baixo, mas falta manutenção

Uma das maiores reclamações de moradores dos 285 apartamentos da Colina é a falta de manutenção. Tanto que não são raros os casos de professores que tiram dinheiro do bolso para arcar com reformas no patrimônio da UnB. Até Cosmo Balbino, coordenador da Secretaria de Gestão Patrimonial da UnB e morador do bairro há 23 anos, já custeou melhorias onde mora. Os reparos não acontecem por uma série de motivos. O mais importante deles é a escassez de recursos.

Algumas reformas são urgentes. Nos prédios da Colina Velha, o encanamento ainda é o original, fabricado em ferro. Em algumas torneiras, o primeiro jato de água geralmente vem acompanhado de ferrugem. "Quem decide a destinação das verbas é o Conselho Diretor, mas ele deixou de existir há cinco anos", explica Balbino. O mandato dos conselheiros foi vencendo, sem que houvesse novas nomeações. O atual reitor, Ivan Camargo, já encaminhou uma lista com sugestão de nomes para aprovação da presidente Dilma Rousseff.

Só esse grupo pode se debruçar sobre o reajuste nas taxas pagas pelos moradores para ocupar os imóveis. "Tem gente que mora na Colina há 17 anos e paga R$ 193 por um apartamento de dois quartos, sem que a taxa tenha sido reajustada. Isso é impensável na capital federal. E não é suficiente para arcar com os custos", afirma Balbino. Tão insuficiente quanto os recursos é a quantidade de imóveis para professores e servidores, ainda que a UnB tenha um dos maiores patrimônios imobiliários do Distrito Federal. Atualmente, a demanda reprimida de alojamento soma exatos 675 funcionários.


1,4 mil número de imóveis da UnB no Distrito Federal


Quem frequenta
Relação de amor

Passando pelo Câmpus Darcy Ribeiro, na Asa Norte, um dia o estudante de engenharia civil Paulo Paiva, 27 anos, parou para prestar atenção naqueles prédios residenciais escondidos em um dos cantos da UnB. Gostou do ambiente da banca de revistas. Era o início da vida acadêmica e também da relação de amor - depois disputado em litígio - com a Colina. Raro é o dia que Paulão não passa por lá. Nem que seja só durante cinco minutos, para um simples oi. "Fiz amizade com a Fran e o Geraldo (marido da comerciante e também proprietário da banca). A gente é bem-tratado", conta. No meio da entrevista, ele dá mostras das amizades e da confiança que conquistou. Assume o caixa da loja enquanto a dona é fotografada.

Há algum tempo, o estudante engatou um namoro e convenceu a moça das qualidades do lugar. Quando o romance acabou, os ex-namorados tinham que decidir quem ficava com a guarda da banca. "Ficou para mim, né?", enfatiza Paulão. Morador do Lago Norte, mesmo aos fins de semana ele opta por sair de casa e ir encontrar os amigos por lá. O universitário talvez extrapole os limites da simpatia com o local.

Turismo
Para o estudante universitário, a Colina passou a ser até ponto turístico. Foi esse o primeiro lugar de Brasília que ele mostrou a duas amigas que vieram de Belo Horizonte para conhecer a capital do país, por exemplo. Prestes a se formar, antes de sair de vez da UnB Paulão já tem planos para fazer um churrasco de despedida, que, claro, deve acontecer na banca mesmo, com todos os amigos que fez ao longo do tempo em que frequentou a Colina. "Vou continuar vindo para cá. Mesmo depois de formado", promete ele.


"Vou continuar vindo para cá. Mesmo depois de formado"
Paulo Paiva, 27 anos, estudante de engenharia civil



Quem projetou
Inusitada e funcional

Paulo Marcos Paiva não sofre de cromofobia. O arquiteto explica logo que usa cor nos projetos, ao contrário de colegas de profissão. Saber disso ajuda muito a entender a concepção dos prédios que formam a Colina Nova, composta por sete blocos inaugurados em 1988 - os quatro edifícios da Colina Velha são obras de João da Gama Filgueiras Lima, o Lelé, um dos mais importantes arquitetos brasileiros. Ele venceu em 1985 o concurso aberto pelo Centro de Planejamento da UnB para a construção de novos prédios habitacionais.

A falta de manutenção adequada deixou o tempo lavar os amarelos, azuis, verdes, vermelhos e laranjas que distinguiam cada prédio. Hoje, ao vivo e em cores só se vê um pedacinho daqui e outro de lá, por força do zelo de algum morador. Os tons, selecionados com a ajuda de Athos Bulcão, compuseram até mesmo os brises, um dos elementos que garantem o conforto térmico dos apartamentos. "Na época, eu disse que era inspirado nas bandeirinhas de Volpi, mas me inspirei mesmo nas festas populares nordestinas, como a de são-joão", conta Paiva, pernambucano de Triunfo.

Os prédios voltados para o lago têm áreas vazadas na coluna do elevador. O professor ensina os nomes certos: transparência ou porosidade. A escolha resulta em uma varanda inusitada, mas não foi estética. Foi funcional. "Isso garantiu a circulação de ar para os blocos da frente", explica. Ao contrário dos prédios de Lelé, as projeções dele têm balcões, outro elemento típico do Nordeste. Tanto que muitos moradores replicam ali o uso da rede. Além disso, têm garagem e alcançam seis andares, respeitando a recomendação do limite de altura de Lucio Costa. Por dentro, a preocupação foi projetar apartamentos confortáveis, luminosos.

Os atrativos serviram para tentar professores de outros estados a virem para a UnB. "A ditadura tinha acabado, muitos professores estavam voltando e outros eram convidados a vir", relembra. Há partes incompletas do projeto, como a praça de convivência, com uma fonte no centro, que nunca saiu do papel. Olhando para seu legado, faria poucas alterações. Talvez adotaria a tendência de maior integração entre a sala e a cozinha. Para saber mais, precisaria ter tido experiência prática. Logo ele, que resistiu aos anos de chumbo na UnB e assina o projeto tão querido pelos moradores, nunca habitou a obra. "Tinha fila", resume.
















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